Uso Eficiente da Água nos Dias Atuais
Com agravamento da crise da água brasileira, os meios de comunicação passaram a dar importância ao tema e incluí-lo nas suas pautas. Peças informativas desenvolvem as diversas nuances que o assunto pode assumir.
Sugerimos o link de acesso a uma matéria do jornalista Tonico Ferreira, que faz parte da série “Água – Planeta em Crise”, realizada para o Jornal da Globo em parceria com Globo natureza. Com extrema agilidade a reportagem apresenta um painel sobre as tecnologias de reuso da água nos Estados Unidos, Singapura, Austrália e pesquisas brasileiras.
Há inclusive uma citação sobre o trabalho do professor David Sedlak, da Universidade de Berkeley, na Califórnia, que em uma de suas obras afirma que o sistema de abastecimento de água passou por quatro importantes revoluções nos últimos 2.500 anos.
A primeira foi com aquedutos romanos que transportavam água a longas distâncias. A segunda no século XIX, com o tratamento da água que havia se transformado vetor para a transmissão de doenças pela contaminação com esgoto urbano. A terceira revolução, no século passado, se deu pelo tratamento do esgoto antes do lançamento no ambiente natural. A quarta revolução está associada ao desenvolvimento das tecnologias que possibilitam tratar o esgoto das cidades, transformando-o novamente em água potável para reuso.
“O professor David Sedlak ensina que, os danos econômicos associados à falta da água são muito maiores do que os investimentos para obter um suprimento de água seguro.”
Link de acesso à matéria:
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O Primeiro Conflito Hídrico Brasileiro e o MUSA
O ano de 2014 será lembrado como aquele no qual o tema “gestão de recursos hídricos” entrou definitivamente na pauta de discussões da sociedade brasileira. Não foi da melhor maneira. Foi graças às alarmantes notícias geradas por uma seca impiedosa que se abateu sobre o sudeste brasileiro. Presença constante na região nordeste, o stresse hídrico ou crise da água, de muito já rondava outras regiões do Brasil.
Apesar do alerta dos especialistas, autoridades e opinião pública ainda mantinham a ilusão de que o Brasil por ser possuidor de imensos mananciais, estava blindado contra a crise da água. Com base neste aparente quadro de opulência hídrica, os usos sem critérios adequados se multiplicaram; as agressões às nascentes e alterações de cursos d’água tornaram-se constantes e justificáveis sob a ótica desenvolvimentista. A resultante deste grave equívoco foi a extinção e comprometimento de nascentes, a contaminação das bacias hidrográficas por resíduos sólidos e líquidos, destruição da flora e fauna aquáticas e o aumento do custo de tratamento da água para o consumo humano.
O stresse hídrico na região sudeste foi uma realidade construída dia a dia, na qual brasileiros assistiram passivamente os mananciais hídricos diminuírem ou se tornarem imprestáveis para satisfação das suas necessidades mais elementares. Estava tudo a mostra para quem quisesse ver. Somente quando a escassez de quantidade tornou-se irrefutável, a população chegou à conclusão de que a crise da água não se tratava de uma profecia absurda ou histeria propagada por ecologistas inconsequentes, como muitas vezes o assunto era tratado pela imprensa, políticos e agentes da economia.
Desde 2009 a Comissão Pró-MUSA vem estudando os recursos hídricos. Já no início dos nossos trabalhos, foi proposto pelo Engenheiro Luiz Antônio Timm Grassi, como condição sine qua non para o correto desenvolvimento da Proposta do MUSA, a realização de oficinas sobre a gestão dos recursos hídricos. Segundo o engenheiro, era essencial que a comissão entendesse a dinâmica do ciclo da água, seus múltiplos usos, as questões ligadas à escassez de qualidade (poluição) e os problemas ligados à escassez de quantidade (seca).
Voltando ao caso atual, é bom frisar que a atual crise da água não se estabeleceu de uma hora para outra. Ela teve sua origem ligada à falta de um planejamento urbano adequado, estudos aprofundados sobre o manejo das bacias hidrográficas, uso intensivo do solo e desrespeito às normas de proteção ambiental. Inclua-se nesta lista, a falta de leis de proteção efetiva das nascentes e dos cursos d’água. (O Novo Código Florestal Brasileiro, por exemplo, oferece menor proteção aos mananciais hídricos do que na lei anterior.)
Um dos efeitos desta seca foi o estabelecimento, em abril de 2014, do primeiro conflito hídrico da história brasileira. Protagonizado pelos governos do Estado de São Paulo e do Estado do Rio de Janeiro, o conflito este em torno do desvio do Rio Paraíba do Sul, rio responsável por grande parte do abastecimento de água fluminense. Este desvio serviria para alimentar o Sistema da Cantareira. O Cantareira faz parte de um conjunto de represas que abastece cerca de 20 milhões de pessoas da região metropolitana paulistana. As relações se estremeceram entre os dois estados, aponto de haver a necessidade de intervenção federal através da mediação do conflito pela ANA – Agência Nacional de Águas.
Citamos também, o conflito estabelecido pelo racionamento de água, que já está acontecendo na periferia paulistana, onde algumas regiões recebem o abastecimento de água apenas 3 horas por dia. Embora, o governo estadual negue o racionamento, o mesmo é uma realidade. Em razão deste fato, moradores atingidos pela falta de água, no dia 26 de fevereiro 2015, fizeram uma marcha de protesto de cinco quilômetros da zona oeste, até a sede do governo estadual, para demonstrar sua indignação. Pois, segundo os manifestantes, estão sendo discriminados, já que nas partes nobres da cidade a água continua sendo distribuída normalmente.
Com relação à crise da hídrica do sudeste, lembramos que esta afeta a agricultura no interior de São Paulo e sul de Minais Gerais, onde as represas que garantiam a irrigação, pecuária e também o turismo estão completamente secas. Outro fenômeno ligado ao baixo volume dos grandes reservatórios é a diminuição da vazão de água na geração de energia elétrica, para garantir que os mesmos não venham a secar rapidamente. Esta por sua vez irradia consequências para todo país, uma vez que torna energia elétrica mais cara para todos. Para suprir as necessidades energéticas, o governo tem que comprar energia de fora; ou então utilizar a geração de eletricidade através das usinas termoelétricas, estas sabidamente mais poluentes e de custo geração muito superior ao das usinas hidrelétricas.
Embora, a reação à crise hídrica paulista, por conta da Copa e eleições 2014, tenha sido inicialmente muito a quem do necessário, as campanhas de conscientização conseguiram poupar até o momento 100 bilhões de litros.
A comunidade científica aponta que não há qualquer possibilidade da crise hídrica paulistana ser superada a curto e médio prazo. As sugestões para a superação passam pela recuperação de vinte mil hectares de vegetação no entorno das represas e córregos alimentadores, com o plantio inicial de 30 milhões de árvores a um custo de R$ 195 milhões reais, diminuição do desperdício na distribuição de água tratada de 30% para 15%, uso de esgoto tratado para consumo humano. Em casos extremos a dessalinização. Por se tratar de processo oneroso e demorado quanto à sua implantação. Israel, por exemplo, iniciou o processo dessalinização nos anos 1970, captando água do Mar Mediterrâneo, concluindo as grandes usinas de tratamento apenas na década passada. Hoje em dia, 6 entre 10 israelenses consomem água mediterrânea trada.
O stresse hídrico não é uma exclusividade brasileira. Há muito tempo deixou de ser uma mera expectativa para se tornar uma ameaça real à sobrevivência do planeta. Em alguns lugares por onde ele se instaura as marcas deixadas são absolutamente assustadoras. Inclusive, muitos acreditam em futuros conflitos mundiais em torno da água para beber. A reversão deste quadro maléfico passa por uma visão estratégica de combate ao aquecimento global e uso racional dos recursos hídricos. Neste sentido, mudanças de comportamento relativas aos usos múltiplos da água são imperativas em todos os níveis.
Diante deste quadro caótico, o MUSA quer propor reflexões que vão muito além de meros esclarecimentos sobre o ciclo da água. O nosso MUSA quer se firmar como uma ferramenta auxiliar na gestão de recursos hídricos, na medida em que sua função essencial é a conscientização da população sobre a importância da água nos diversos contextos em que ela está inserida nas nossas vidas. Possibilitando assim, mudanças de hábitos e costumes que apontem para o consumo racional da água, ações em defesa dos mananciais e cobrança dos diversos setores da sociedade de uma política efetiva de gestão dos nossos recursos hídricos.
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O Museu Professora Abrilina Hoffmeister Tramandaí /RS
Os museus são peças importantes na construção do conhecimento da nossa sociedade, na medida em que preservam a memória de uma cidade, país ou pessoa. Porém, esta importância transcende as questões meramente preservacionistas. Ao estabelecer pontes com o passado, pensamentos, mundos, tempos diferentes, os museus nos propiciam o desenvolvimento de um senso crítico indispensável para reflexões sobre a nossa própria contemporaneidade.
Considera-se superada aquela antiquada noção do museu como uma casa que acumula e expõe coisas velhas. Hoje em dia existem diversas formas de musealização. Somaram-se aos tradicionais museus históricos, os museus de ciência, os museus de arte, os ecomuseus, as cidades museus. Por fim, acompanhando o desenvolvimento das tecnologias da informação, surgiram os museus virtuais.
Quanto mais nos aprofundamos nos estudos museológicos, mais nos tornamos exigentes para com os fundamentos basilares do nosso Museu das Águas de Porto Alegre. Assim como, independentemente de qualquer crítica, nos sentimos mais respeitosos com todas as casas voltadas a preservação da memória, divulgação do conhecimento e apreciação das artes.
Há sempre o que aprender nas instituições museológicas. Os relatos que seguem foram coletados do Museu Professora Abrilina Hoffmeister, no Município de Tramandaí, térreo da Câmara de Vereadores. Trata-se de um museu muito simples na sua constituição, com acervo formado por fotos e objetos do cotidiano, que resgatam hábitos e um pouco da historia daquele balneário do litoral gaúcho.
A colonização inicial do município se deu pelas mãos do povo dos Açores. Já a transformação daquelas paragens em balneário de verão, iniciada no final do século IXX, teve forte influência da colônia alemã. Cite-se as famílias Sperb e Hoffmeister . O hotel da família Sperb, por exemplo, foi inaugurado em 1898.
A cidade inicialmente se concentrava ao longo do rio, distando do mar cerca de 1 Km. O primeiro meio de transporte público utilizado para levar os veranistas até a praia foram carretas com toldo de palha, puxadas por diversas juntas de bois.
No início do século XX, os trajes de banho eram de flanela, para aquecer e não aderir ao corpo. Os banhos eram antes do sol nascer. Nos anos de 1900 os banhos de mar eram considerados tratamento de saúde.
Agora, vejam-se os banhistas no final da década de 1920, com seus trajes atléticos. São hóspedes do Hotel Balnear, antigo Hotel da Saúde. À frente o arrendatário do hotel, mom a boia o pescador, Lúcio Enéas, contratado para a função de salva-vidas.
No flagrante a seguir, temos uma orquestra ao lado de uma jardineira (ônibus da época).Cada hotel tinha sua própria orquestra, que tocava diariamente durante as refeições. Após o jantar havia os tradicionais “Bailes das 11”. Horário em que eram desligados os geradores de eletricidade. Observe-se que a fama de descolados dos músicos é histórica. Este registro fotográfico foi feito em 1926.
Nos anos 1930 foi instalado um bonde que levava os banhistas até a beira do mar.
Há também a possibilidade de se ver registros curiosos como a pesca (caça) do jacaré em 1926.
Os salva-vidas de 1945…
As banhistas do final da década de 1940.
Também, neste período, Luiz Gesenwenter, fundou a companhia Dindinho para transporte de passageiros. Esta companhia atuou soberana durante as décadas seguintes. O dindinho era um vagão aberto rebocado por um caminhão.
Na verdade, sete caminhões militares da Segunda Guerra Mundial, GMC CCKM, datados de 1942. Não se espantem, mas os sete veículos foram preservados por herdeiros da família Michelon, que adquiriu companhia em 1975. Os dindinhos deixaram funcionar em Tramandaí na década passada.
Os saudosos podem acessar:
Pode-se ainda, contemplar objetos do cotidiano de épocas variadas. Destacamos o altar, imagens e objetos da Capela de Nossa Senhora dos Navegantes, construção do ano de 1908.
Embora, a formatação do museu não se enquadre dentro das tendências museológicas contemporâneas, recomendamos a visita ao museu Professora Abrilina Hoffmeister, na cidade de Tramandaí.
* Texto/Edição : Leonel Braz_____________________________________________
A Ponte de Pedra de Porto Alegre
Em 1846 a Província do Rio Grande era governada por Luís Alves de Lima e Silva, o conde de Caxias. Depois de estabelecer a paz entre os imperiais e farroupilhas, o conde foi designado para tomar conta do Rio Grande até que os ânimos se acalmassem. Naquela época a capital da província era a cidade de Porto Alegre.
Pois, foi no ano 1846 que o conde decidiu construir uma ponte de pedra sobre o riacho, na embocadura da Rua da Figueira, próximo ao local onde o riacho se encontrava com o Guaíba. No relatório daquele ano, explicou que depois de ordenar várias vezes o conserto da ponte de madeira existente, mais vantajoso para o império seria a construção de uma ponte de pedra.
Coube a João Batista Soares da Silveira a tarefa de construir a ponte de pedra. Mesmo com a província envolta em dificuldades econômicas, foram gastos pelo império 980 contos de réis na construção da benfeitoria.
A construção foi inteiramente feita com mão-de-obra escrava e levou dois anos para ser concluída, sendo inaugurada em 1848. O construtor da ponte, anos depois, seria responsável pela construção do Edifício Malakoff, que por muito tempo seria considerado como a mais alta construção da cidade.
A ponte reinou absoluta por quase um século, até que nos anos 1940 o arroio Dilúvio foi canalizado e ela perdeu sua serventia. Nos dias atuais a ponte voltou a ser utilizada como passagem de pedestres que se dirigem do centro da cidade até o centro administrativo do estado. Sob um espelho d’água a ponte é um dos pontos turísticos da cidade, além de um raro exemplar da arquitetura imperial na cidade de Porto Alegre.
pesquisa: Leonel Braz________________________________________________
O Antigo Chafariz da Praça da Matriz
Não é de hoje que os louvores à política desfiguram os monumentos e apagam história da cidade de Porto Alegre. Citamos como exemplo o primeiro elemento decorativo da Praça da Matriz, um chafariz que ficava no centro praça. Considerado local de máxima elegância em 1900, a Praça da Matriz era ponto de encontro dos namorados e das famílias que moravam no centro da cidade. Inclusive era de muito bom tom, nesta época, circular no entorno da fonte d’água e apreciar daquele local os casarões e o movimento das embarcações contornando o Guaíba. O referido chafariz foi retirado do logradouro onde se encontrava para abrigar o monumento dedicado ao político Júlio de Castilhos, que foi inaugurado em 1914.
Na aquarela abaixo, do pintor Hélio Ricardo Alves, pode-se observar a localização do chafariz, tomando como base a imagem do Theatro São Pedro ao fundo.
O chafariz era adornado com cinco estátuas de mármore branco representativas dos cinco rios formadores do Guaíba. Estas estátuas são consideradas como as obras de arte mais antigas em exposição permanente nas ruas da cidade, pois foram criadas ainda no século XIX. Percebe-se neste outro trabalho de Hélio Ricardo Alves, um desenho a bico de pena, o quanto era delicada e maravilhosa aquela fonte d’água.
Do chafariz restaram apenas quatro das cinco estátuas. Atualmente elas podem ser apreciadas na Praça Dom Sebastião, situada na Avenida Independência, em frente ao Colégio do Rosário.
Abandonadas, mutiladas, desglamorizadas e expostas ao vandalismo, as quatro esculturas em mármore branco, agora encardido, ainda conservam grande parte da sua encantadora beleza original.
Sabe-se extraoficialmente que uma das figuras de mármore correspondente ao Rio Taquari, foi arrancada do patrimônio público e histórico porto-alegrense, indo parar no acervo de um colecionador particular.
* Texto e fotos – Leonel Braz
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Estado e sociedade nas iniciativas para recuperação ambiental do Guaíba (1979 a 2004)
Depois de prestigiar este Blog com a autorização para publicação de seu trabalho de conclusão no Curso de História – UFRGS, denominado “Degradação das Praias de Porto Alegre”, Antonio João Dias Prestes volta a nos presentear com outro trabalho de grande significância: “Estado e sociedade nas iniciativas para recuperação ambiental do Guaíba (1979 – 2004)”.
Trata-se da Dissertação de mestrado apresentado ao Programa de Pós-Graduação em História da Universidade do Rio Grande do Sul como requisito para obtenção do título de Mestre em História.
De acordo com o autor, esta dissertação tem como objetivo investigar em que medida os esforços para a recuperação ambiental do Lago Guaíba em Porto Alegre e na sua região metropolitana decorreram de uma participação mais intensa da população local na definição das prioridades para os investimentos públicos, e de que forma tem-se dado esta participação, identificando os agentes sociais envolvidos e seus limites de atuação.
Não é possível abordar este problema sem considerar uma envoltória mais ampla, que inclua as relações da sociedade local com as praias do Guaíba e o aproveitamento paisagístico de sua orla urbana, dando conta de sua historicidade. O problema é estudado a partir de diferentes perspectivas, que estão interligadas. Em primeiro plano, são destacados os processos de exercício da cidadania e de formação de uma consciência social, no que se refere à mobilização popular para o atendimento de demandas básicas de qualidade de vida, como o saneamento básico, mas também o acesso a um meio ambiente não degradado.
A consolidação destes processos, de uma forma mais efetiva, é fortemente associada à capacidade dos agentes sociais nele envolvidos de obter a intervenção do Estado, por meio da aplicação de políticas públicas especificamente voltadas ao atendimento destes objetivos.
Para acessar a dissertação basta clicar no link a seguir:
http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/61185/000863470.pdf?sequence=1
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Água para Porto Alegre
Como já falamos em outra oportunidade, a primeira doação feita ao Museu das Águas de Porto Alegre foi uma coleção de recortes de jornal da coluna Almanaque Gaúcho (*), editada pelo saudoso jornalista, escritor e advogado Olyr Zavaschi para o Jornal Zero Hora.
A coleção abrange uma década de trabalho do jornalista e veio pelas mãos do Senhor Roberto Weber Bortolomiol, que a encontrou descartada na rua. Roberto, compreendendo a importância de seu achado, resolveu dar melhor destino à coleção procurando-nos para saber sobre nosso interesse.
O texto apresentado a seguir foi publicado no dia 18 de dezembro de 2011.
Água para Porto Alegre
Parece incompreensível que Porto Alegre, debruçada sobre o Guaíba e sua fartura de água, tenha tido preocupações com o abastecimento desse líquido indispensável. Sérgio da Costa Franco relata que, já em 1780, a vereança do povoado recém criado mandava “consertar a fonte que está fora do portão”. Em 1839, o viajante Nicolau Dreys escreveu que “se Porto Alegre tem alguma coisa que desejar, será talvez maior abundância de água potável”.
As soluções para o problema começariam a surgir aos poucos com a construção de fontes públicas, mas só ganhariam uma obra definitiva com a Companhia Hidráulica Porto-Alegrense (instalada na Praça da Matriz), que começaria a canalização para as residências. Depois viria a Hidráulica Guaibense (Moinhos de Vento), que captaria e traria a água do Guaíba.
Mas foi há exatos 40 anos que surgiu em Porto Alegre o Dmae (Departamento Municipal de Águas e esgoto), uma autarquia exclusiva para o serviços de saneamento (**).
Fonte: Porto Alegre – Guia Histórico, de Sérgio da Costa Franco.
(*) A referida coluna jornalística é um verdadeiro guia de estudos sobres fatos da história gaúcha, pois a síntese apresentada sempre vem acompanhada de fotos, ilustrações e a fonte originária.
(**) O Dmae órgão vinculado à Prefeitura Municipal de Porto Alegre responsável pela captação, tratamento, armazenamento e distribuição de água potável e pela coleta e tratamento do esgoto sanitário (cloacal); pela leitura de consumo e respectiva cobrança. Foi fundado em 15 de dezembro de 1961 e atualmente presta seus serviços para uma população de cerca 1,4 milhão de porto-alegrenses.
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A Repercussão da Assinatura do Protocolo de Criação da Comissão Pró-Museu das Águas – 23 de Março de 2012
Orgulhosamente apresentamos algumas matérias jornalísitcas que circularam na imprensa sobre a assinatura do Protocolo de Intenções Pró-Museu das Águas.
G1
http://g1.blobo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2012/03/prefeitura-de-porto-alegre-formaliza-apoio-criacao-do-museu-das-aguas.html
Diário Gaúcho
Zero Hora
UFRGS
ABES
CORREIO DO POVO
Afonso Ritter
Atenção: Estamos providenciando a substituição dos Links abaixo!
Rádio Gaúcha AM 600 Khz | FM 93,7 Mhz
Gaúcha Repórter – Capital dos gaúchos ganhará uma nova opção cultural
Gaúcha AM 600 Khz | FM 93,7 Mhz
Notícias da Região Metropolitana – Foi lançado projeto do Museu das Águas em Porto Alegre
Band AM 640 Khz
Tempo Real – Porto Alegre poderá contar com um museu para a história da água
Band TV
Boa Tarde RS – Museu das Águas de Porto Alegre será atrativo na orla do Guaíba
Band TV
Band Cidade – Museu que conta história da água poderá ser construdo em Porto Alegre
TVE
Jornal da TVE – Lideranças do Estado e Capital assinam protocolo de intenções para apoar criação do Museu dos Mananciais de Porto Alegre
Ulbra TV
Ulbra Notícias – Museu das águas deve ser construído às margens do Guaíba em Porto Alegre
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O Porto da Capital
Em tempos de revitalização do Cais Mauá em Porto Alegre, apresentamos a coluna “Almanaque Gaúcho”, do saudoso jornalista Olyr Zavaschi sobre o cais, publicada na edição de Zero Hora do dia 26 de agosto de 2006.
Há 90 anos, em agosto de 1921, o presidente do Estado, Antônio Augusto Borges de Medeiros, inaugurou oficialmente o Porto Alegre. A construção desse equipamento de infra-estrutura dava, finalmente, à capital gaúcha, gaúcha, condições de receber navios transoceânicos. O porto tinha cerca de 800 metros de cais, um armazém de estrutura metálica, um edifício para a administração e o armazém provisório B-1.
O primeiro projeto foi elaborado em 1899 e ampliado em 1904. Em 1913, foi inaugurada uma parte inicial, com cais de 140 metros. No relatório de fim de governo, em 1927, Borges comunicou à Assembléia de Representantes que se achavam concluídos 1.652 metros do cais. As obras continuariam até 1937, quando o projeto foi dado como concluído.
Para se ter uma idéia da importância e do movimento do porto, é suficiente lembrar que em 1922, no ano seguinte à da inauguração, nada menos que 22.565 embarcações (1.396 de longo curso e cabotagem e 21.169 de navegação fluvial) usaram a estrutura do porto.
Atualmente o porto (incluindo os cais Mauá, Navegantes e Marcílio Dias e 25 armazéns. E ostenta o título de maior porto fluvial brasileiro.
(Colaboração de Tatiana Delatorre, de Porto Alegre)
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Quando o Guaíba Era Aeroporto
(Recebemos uma preciosa doação. Uma coleção de 10 anos de recortes da Coluna Almanaque Gaúcho, publicada na Zero Hora, caprichosamente encadernada. Enquanto, investigamos a autoria deste meticuloso trabalho, apresentamos a transcrição da do dia 21 de agosto de 2002, redigida pelo colunista Olyr Zavaschi.)
No começo da aviação comercial brasileira, os hidriaviões se mostravam mais práticos e rentáveis. A precária estrutura dos campos de pouso terrestre fazia com que a opção fosse equipamentos que utilizassem os rios, lagos e o mar.
O primeiro aparelho da VARIG (que foi a pioneira na aviação comercial do Brasil) foi por isso, compreensivelmente, umhidroavião – o Atlântico.
O Rio Grande do Sul já havia conhecido experiências aéreas, em especial graças o Correio Aéreo francês, que fazia a rota heróica Paris-Santiago do Chile, passando pela Espanha, norte da África, nordeste do Brasil, Santos, Rio, Florianópolis, Porto Alegre (às vezes Pelotas e Jaguarão), Montividéu e Buenos Aires. Mas foi com hidroaviões que usavam o Guaíba e a Lagoa dos Patos que nasceu a aviação de passageiros no Brasil, liderada por gaúchos.
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Museu da Água de Yasd
Viajar pelo Irã é conhecer um povo que sabe, pela mais dura experiência, o quanto a água é importante. A aridez é presente em quase todo o território, marcado pela presença de grande área desértica. Desde os tempos mais antigos, os iranianos (persas) tiveram que empenhar toda sua criatividade para suprir suas necessidades com os escassos recursos hídricos que a natureza lhes oferecia. Isso implicou a busca de soluções engenhosas e, ao mesmo tempo, o enfrentamento das disputas pelo líquido vital aos indivíduos e à sociedade. Por todo o país, encontram-se referências históricas ao valor dado à água pelas populações e pelos governantes, seja nas construções preservadas em sítios arqueológicos (reservatórios, depósitos de gelo, condutos etc), seja nos antigos documentos sob forma de escrita cuneiforme em placas de argila ou de inscrições em monumentos.
Bem natural, portanto, que essa rica experiência fosse, algum dia, valorizada para ser preservada para o conhecimento dos pósteros.
A cidade de Yasd fica na região central do país, em um oásis limitado por duas regiões desérticas e duas cadeias de altas e áridas montanhas. É considerada a cidade com o clima mais seco do Irã, com uma média anual de precipitação de 60 mm (para comparação, em Porto Alegre chove mais de 1300 mm por ano). A busca pela água, a convivência com a escassez, os métodos utilizados para o abastecimento e a conservação do líquido e as regras para seu compartilhamento acompanharam a história três vezes milenar da cidade.
No ano 2000, por ocasião de um simpósio internacional sobre o sistema de captação de água chamado “qanat”, foi inaugurado o Museu da Água de Yasd, com um acervo formado desde 1992. O museu fica no centro da cidade, em uma antiga mansão da época da dinastia Qadjar (século XIX). Externamente, sua fachada confunde-se com a profusão de prédios de diversas épocas de uma cidade que cresceu bastante.
Ao entrar, o visitante depara-se com um bonito pátio interno do qual se penetra no recinto do museu, a maior parte no subsolo.
A história do aproveitamento da água, no Irã, é apresentada por fotos, documentos, utensílios e diversos outros artefatos, em uma série de salas e no próprio pátio.
O visitante pode igualmente, aprender, através de maquetes, como funciona o principal sistema de captação da água em uma região tão árida. O centro da exposição é justamente a demonstração desse sistema, chamado “qanat” (ou “kārēz’, no persa antigo), através do qual a água de um poço nas montanhas (onde encontra-se água subterrânea mais próxima do solo) é trazida através de canal subterrâneo, por gravidade, até os campos de cultivo e a cidade. Em alguns casos, o “qanat” também é aproveitado para produzir energia mecânica, através de roda dágua.
Esse engenhoso sistema surgiu há cerca de três mil anos e ainda hoje é utilizado (na metade do século XX ainda funcionavam cerca de cinquenta mil “qanats” no Irã, dos quais ainda muitos em atividade). Nas cidades, um “qanat” divide-se em diversos canais que passam pelo subsolo das casas, onde há pequenos reservatórios, dos quais pode ser tirada a água para os usos domésticos.A residência onde hoje é o museu tem um desses recintos, onde se pode ver como chegava e era conservada a água. O setor do museu que trata da repartição da água apresenta documentos com autorizações, projetos e outras determinações relativas aos direitos e obras para o compartilhamento do recurso tão escasso.
Muito interessante é o artefato que servia para medir a quantidade de água que cada usuário podia ter, por período de tempo (dependendo das condições de disponibilidade). Quem arbitrava essa distribuição era uma anciã, escolhida pela comunidade, chamada “Mãe da Água”. Desnecessário dizer que esse arbitramento era respeitado pelos usuários, pois era a maneira de evitar os conflitos pelo uso da água. Pode-se dizer que é o embrião da gestão dos recursos hídricos.
Ao visitar, em fevereiro, esse museu e, ao ver artefatos e documentos seculares, percebi, concretamente, o que uma instituição desse tipo pode representar para a conscientização sobre a importância da água para uma sociedade, especialmente no caso em que a escassez tem sido sentida muito concretamente, ao longo da história. Ao mesmo tempo, a beleza dos objetos e das fotografias remeta à possibilidade da criação artística a partir da temática da água.
Luiz Antonio T. Grassi
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Vida e Costumes nos Anos 1950 – Ilha da Pintada
Dona Neusa Maria Cunha da Silva nasceu na Ilha da Pintada, Porto Alegre, em 16 de abril de 1951. Morava na margem do rio Jacuí, na Rua Nossa Senhora da Boa viagem, 150. Sua casa era aconchegante, modesta, sem forro e com os quartos separados. Relata, que na década de 50 a Ilha da Pintada era um vilarejo simples, aprazível e bastanteorganizado.
Mesmo sem as facilidades advindas com a construção da Ponte do Guaíba, inaugurada somente em 1958, nos início dos anos 50, havia na Ilha cinema, cartório, agência dos correios, três armazéns e uma escola fundamental. Inclusive lembra que de vez em quando a comunidade da Ilha da Pintada recebia a visitada de circos mambembes.
Nos terrenos ribeirinhos haviam cercas de arame farpado. Porém, os vizinhos que moravam afastados do rio tinham franco acesso às margens, podendo atravessar sem nenhum receio estas propriedades para alcançar a as águas do Rio Jacuí. Ao redor desta comunidade encontravam-se banhados (tinha uma sanga a 50 metros de sua casa), pequenos canais e propriedades rurais.
Quando necessitava comprar leite, ela passava por roletas colocadas nas propriedades rurais para impedir a fuga de gado.
Segundo Dona Neusa, neste período a água do Rio Jacuí era Pura. Sendo costumeiro entre os habitantes da ilha, levantar cedo e ir até o rio encher talhas com água para o uso doméstico (limpeza e cozimento de alimentos). Também, naquelas águas eram lavadas as roupas e tomava-se banho. Os fogões eram abastecidos com lenha coletada na ilha em frente. Uma atividade pesada, mas necessariamente presente no cotidiano de todas as famílias. Nas casas os sanitários eram as patentes e os moradores jogavam cal e capim para se amenizar os odores.
A luz elétrica chegou apenas em 1961. Alguns anos depois seria implantada a rede hidráulica, fato relevante para a comunidade, tanto que muitos ainda lembram o nome do funcionário do DMAE responsável pelo serviço, o “seu Máximo”.
Os habitantes da Ilha efetuavam as demais compras de mantimentos, vestuário, utilidades domésticas no cais do porto e lojas do centro da cidade. Bem como, também buscavam seu lazer no centro. Dirigiam-se até zona central nos próprios barcos de pesca, atracando suas embarcações junto ao cais Mauá. Tanto os barcos grandes como as baleeiras; ou pequenos como os barcos a remo denominados “caícos”, eram utilizados pela população da Ilha da Pintada neste translado.
O barco de pesca da família de Dona Neusa era uma imensa canoa motorizada chamada “Magnólia”. A embarcação também servia para o lazer da família, levando-os a acampamentos realizados nas ilhas do delta do Rio Jacuí, tais como: a das Balseiras, do Conde e Conga.
A atividade econômica da população da ilha era predominantemente a pesca. Segundo Neusa, uma lida dura. A pesca da Piava, por exemplo, levavam exaustivos 20 dias, sendo esta realizada na distante Lagoa Mirim. Ela acompanhava as pescarias, mas não pescava efetivamente. Além da pesca nas Lagoas dos Patos e Mirim, os pescadores perambulavam pelo rio Jacuí, as ilhas do delta e orla do Guaíba A pesca era feita com a utilização de redes e espinhel (linha muito comprida onde se prendem dezenas de anzóis iscados em distâncias regulares). Geralmente manufaturadas pelas mulheres da Ilha, as redes de pesca também representavam uma fonte extra de renda para as famílias. Dona Neusa e a Mãe fabricavam as redes para o uso da própria família e vendiam a produção excedente. Ela recorda que as duas produziam artesanalmente dois tipos de rede. A rede com malha “25”, que tinha cerca de um palmo e destinava-se a captura de peixes graúdos como o dourado, bagre, piava e grumatam; e a rede com malha “3/5” para os peixes miúdos como pintado, peixe-rei e o birú. As redes eram tecidas com cordas de algodão. Ainda, sobre elas aplicava-se um composto a base de “casca roxa” para tingi-las e fortificá-las. (Dona Neusa freqüentou a escola dos 08 aos 12 anos, deixando de estudar por conta do seu trabalho com as redes de pesca.)
As redes de nylon somente chegaram à Ilha da Pintada na década de 70.
Todo o pescado era vendido diretamente no Cais do Porto, na altura do Mercado Público. Quando os peixes se tornavam escassos seu pai e os homens da ilha iam buscar serviço temporário no cais do porto, no DEPREC – Departamento Estadual de Portos Rios e Canais, numa área conhecida como “Quarta”. Lá, realizavam serviços ligados a atividades manuais de estaleiro de barcos, lixando placas de ferro; ou exerciam outras atividades vinculadas aos serviços portuários.
Dona Neusa cita alguns fatos marcantes vividos por ela na Ilha da Pintada: Lamenta não ter ido à inauguração da Ponte do Guaíba, ocorrida em 28 de dezembro1958. Pois, teve que cuidar do avô gravemente enfermo.
Relativo às enchentes, lembra que sua casa havia sido construída muito acima do chão. Motivo pelo qual a morada foi invadida pelas águas apenas uma única vez no ano de 1966. Ocasião em que a água alagou a cozinha e sua família teve que buscar abrigo na igreja. Nesta época, os desabrigados pelas enchentes na Ilha encontravam refúgio na igreja ou na Colônia de Pesca Z5.
Já na enchente de 1967, para socorrer os flagelados, formou-se um grupo de ajuda na ilha, cujos integrantes usavam uma camisa com uma inscrição curiosa e bem humorada, o número “007”. Uma alusão ao agente secreto britânico de sua majestade. Após, a enchente eles continuaram o voluntariado distribuindo charque e outros mantimentos aos desafortunados das ilhas do Delta do Jacuí. Dos eventos religiosos, destaca as procissões de Nossa Senhora dos Navegantes e a de São Pedro (o padroeiro dos pescadores); estas duas manifestações contavam com a participação maciça dos pescadores da Ilha da Pintada. Também, havia a cavalgada dos mortos, quando todos os homens que tinham seus entes queridos enterrados no cemitério de Guaíba, se reuniam para ir à cavalo, em sinal de reverência, depositar coroas de flores nos túmulos de seus parentes.
Em 1971, além do casamento de Dona Neusa, ela cita outro fato significativo para ela e os moradores da Ilha da Pintada. A construção de uma ponte de pedra sobre o arroio da Estrada do Limoeiro em substituição à antiga, que era de madeira. A obra tornou mais segura a travessia da Ilha da Pintada para o Município de Eldorado do Sul, caminho necessário para se alcançar por via terrestre a BR 101, a ponte sobre o Jacuí e as pontes da Ilha das Flores e do Guaíba rumo ao centro da cidade de Porto Alegre. Esta melhora no acesso à Ilha da Pintada propiciou também, nas décadas seguintes, a ocupação desenfreada da Ilha e adjacências. Este fenômeno se deu não só pelas mãos da população menos privilegiada, bem como pela elite que passou a adquirir lotes junto à beira rio para a construção de suas mansões. Enquanto, as propriedades pobres acabaram com os banhados (criatório de peixes e aves) com o aterramento; as propriedades mais abastadas privatizaram a orla pública com seus atracadores particulares e gramados artificiais ( substituição à vegetação natural). Impedindo o direito da população em geral de ter livre acesso às margens do rio Jacuí, tal qual acontecia pacificamente na distante década de 50. Ainda, com relação às mudanças ocorridas na região, Dona Neusa, aponta a destruição das margens naturais do Rio Jacuí, com o conseqüente aumento do canal de navegação. A diminuição dos peixes e da atividade da pesqueira graças à poluição das águas, que fez com que grande maioria dos habitantes da Ilha da Pintada viesse a buscar seu sustento em outros bairros de Porto Alegre e nas cidades vizinhas.
A Degradação das Praias de Porto Alegre
- “bailarina” – Ipanema 1930
Pobre Guaíba, quem te vê, quem te viu. A degradação das praias de Porto Alegre, na passagem dos anos 1960 para os 1970, é título do trabalho de Conclusão de Curso – Bacharelado em História, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, de Antonio João Dias Prestes.
Trata-se de uma obra que tem por objetivo: “levantar as percepções e os impactos da degradação ambiental do Guaíba, com a perda das condições de balneabilidade de suas praias, no inicio dos anos 1970, bem como as iniciativas governamentais no sentido de enfrentar esta situação”. Este primoroso trabalho de pesquisa pode ser considerado como um texto essencial para a compreensão de grande parte das causas que levaram as praias de Porto Alegre ao abandono, ao caos urbanístico e a apropriação por particulares deste valioso patrimônio público, verificado ao longo das décadas seguintes.
Para conhecer o trabalho acesse o link: http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/21326/000736696.pdf?sequence=1
fotos postagem: wp.clicrbs.com.br (ZH -Zona Sul)
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O Bairro Menino Deus e a Enchente de 1941
Em 1941, Dona Geracy da Cruz Braz, 73 anos, tinha 4 anos deidade e morava no Bairro Menino Deus. Possuidora de uma memória prodigiosa ela nos relatou com riqueza de detalhes fatos sobre a vida cotidiana do bairro na década de 40 e de como teve a vida familiar alterada pela famigerada: “Enchente de 41”.
Naquela época a Avenida Getúlio Vargas já era o coração do Bairro Menino Deus. Grande parte do comércio se desenvolvia nela. Padarias, leitarias, açougues e casas de comércio podiam ser vistas ao longo da via, inclusive as construções mais imponentes do bairro. O posto de gasolina da Getúlio com José de Alencar inclusive é daquele tempo.
Nas quadras abaixo da Getúlio em direção a orla do Guaíba a vida era um pouco mais modesta. Em ruas de chão batido pequenas chácaras e casas geminadas de aluguel, semelhantes as que ainda resistem na Travessa dos Venezianos, se misturavam indo até as margens do Guaíba. Em 1941 o rio ia até as imediações da Avenida Praia de Belas. O aterro do Parque Marinha do Brasil foi concluído somente em 1960.
As pessoas das quadras de baixo da Getúlio eram humildes e as casas eram bem simples. Mas, não se tratava de uma favela. A população era de origem variada composta de funcionários públicos e prestadores de serviços. O pai de Dona Geracy, o Sr. Victor Gomes da Cruz, era guarda civil. Victor possuía o respeito da comunidade. Para aumentar a renda criava porcos da índia que vendia para laboratórios farmacêuticos, plantava verduras e criava cabritos num terreno cedido. Excelente tarrafeador, costumava ir ao porto pescar. Na volta repartia com vizinhança o fruto da pesca farta. Além disso, ele sempre era chamado para resolver os conflitos domésticos da vizinhança.
Dona Palmira Gobi, que morava na Rua Itororó com a Rua Costa, personagem porto-alegrense mitológica, devido o emprenho e espírito aguerrido na defesa dos animais contra os maus tratos, era uma das pessoas que pedia socorro ao Guarda Victor. Quando a “carrocinha de cachorros” vinha até o bairro para capturar cachorros de rua, ela corria até a casa do Guarda Victor. O guarda ia até a carrocinha, após um grande bate-boca, mandava os funcionários se dirigirem para outro bairro. Algumas vezes ele se irava e soltava literalmente os cachorros. Note-se que a preocupação das autoridades com os cachorros de rua não era em razão de fatores sanitários. Os pobres cachorrinhos eram vendidos como matéria prima para fábricas de sabão.
O lar de Dona Geracy ficava nas quadras de baixo, na Rua Barbedo, 393, num conjunto de seis casas aluguel. Lembra que as casa eram abastecidas com energia elétrica e água encanada. Não havia canalização do esgoto. A água servida das pias, tanques e chuveiros corriam em canaletas para o fundo das casas que se interligavam a outra perpendicular. O morador da casa 6, por exemplo, veria passar no fundo da casa, as águas servidas das outras cinco casas. Estes pequenos canais conduziam as águas até valões ou riachos que desaguavam no Guaíba ou no Arroio Dilúvio.
No Arroio Dilúvio, aportavam barcas vindas do Vale dos Sinos chamadas pela população de “gasolinas”. As gasolinas comercializavam lenha e frutas nas escadarias do arroio. Lenha era mercadoria importantíssima, não havia distribuição de gás para o aquecimento dos lares e preparo de alimentos.
A curiosidade maior em termos sanitários no bairro repousa nos “cubos”. Os cubos na verdade eram cilindros de madeira, de aproximadamente 70 cm de comprimento, por 40 cm de diâmetro. Os cubos eram distribuídos para a população para depósito de suas fezes e urina. Este artefato era geralmente instalado em latrinas nos fundos dos pátios das casas. Os recipientes eram semanalmente trocados por funcionários da prefeitura.
O conteúdo dos cubos era levado até a Lomba do Asseio na região do Museu Iberê Camargo. No local o conteúdo era jogado diretamente nas águas do Guaíba. Dona Herta Maria Weber Bortolomiol, 74 anos, relata que quando o “ônibus Renaut” passava pela lomba, o veículo subia lentamente por que patinava muito. Então, um terrível cheiro desagradável impregnava o ônibus. Invariavelmente as pessoas gritavam: – Seu motorista! Seu motorista, abre a porta pra ventilar, que a coisa tá braba!
Apesar das chuvas a cidade tentou manter a rotina…
Quanto à enchente de 1941, esta foi antecedida por semanas de intensas chuvas. Os porto-alegrenses viram o Guaíba subir dia após dia. Ninguém acreditava que o nível do Guaíba poderia subir tanto. Móveis e utensílios eram constantemente levantados. Apesar da cheia a cidade tentou manter suas atividades normais. Até que a situação atingiu seu momento crítico e a população teve que abandonar as suas casas. Na casa de Dona Geracy a água atingiu a marca de 1 metro e pai que era dono de um “caíque” (nome dado pelo povo aos barcos de madeira movidos a remo, muito comuns na época), entrou com seu barco dentro de casa para resgatar a família para levá-la até um local seguro.
Dona Geracy, lembra que ela, o pai e a mãe, grávida, foram se abrigar no antigo campo de futebol do time do Nacional, que ficava na Avenida José de Alencar onde existe atualmente um grande super mercado. No campo do Nacional a família ficou abrigada na sede da Associação devido à amizade do pai com o pessoal do time. Nos vestiários e embaixo das arquibancadas ficaram abrigadas dezenas de famílias. Quanto ao tempo que permaneceu na sede do Nacional, Dona Geracy, acredita que tenha sido em torno de 10 dias. Quando as águas baixaram ao retornar para casa a família encontrou uma cobra venenosa de mais de dois metros enrolada em cima de armário da cozinha.
A enchente de 1941 foi causada por três semanas de chuvas intermitentes na região de Porto Alegre e nas nascentes dos rios tributários, somadas ao vento sul, que impediu o escoamento das águas. A cidade viveu dias extrema perplexidade por conta da cheia. Inclusive, dezenas de cidades ficaram isoladas. Houve falta de alimentos, energia elétrica e água potável. O transporte por terra ficou praticamente interrompido. O auge da crise se deu no dia 8 de maio, quando água atingiu a cota impressionante de 4,75 metros no cais do porto. Este dia ficou registrado nos anais de Porto Alegre como “a quinta feira negra”.
Segundo Dona Geracy, a expressão: “abobado enchente”, foi cunhada por conta da enchente de 1941. Apesar de um nascimento obscuro esta gíria tornou-se de domínio popular, significa pessoa tonta, tem conotação levemente pejorativa (pessoa tolinha, bobinha).
Durante os meses de abril e maio choveu 791 milímetros e cerca de 75 mil pessoas ficaram flageladas. A população comportou-se de forma digna diante da adversidade. Foram registrados poucos casos de saques e vandalismo. Rua dos Andradas – Gal. Câmara com Uruguai – 1941